Foto do ensaio The Liquid Serpent

Barbaric philosophy

"So the word 'spirit' and a its kindred terms keep up with wondrous pertinacity the traces which connect the thought of the savage with its hereditary successor, the thought of the philosopher. Barbaric philosophy retains as real what civilized language has reduced to simile".

Tristes Entrópicos

"O que o evolucionismo de Leslie White vira como progresso (o aumento da quantidade de energia extraída per capita) é, ao contrário, degradação: diminuição da diversidade per capita (menos linguagens, menos religiões, menos sistemas de parentesco, menos estilos estéticos, menos espécies naturais, menos animais e plantas), como acontece quando uma floresta tropical arde para alimentar caldeiras ou bois — transformando xamãs e guerreiros em mão-de-obra barata, amores-perfeitos em eucaliptos, informação em energia.

Os tristes trópicos são assim não apenas o campo predileto para a observação in situ de mitos e sistemas de casamento, mas também da ação dos processos de degradação contemporâneos — que geram carne, energia, minérios e valor que uma metrópole absorve para enriquecer a quantidade de mensagens que circulam em seu interior, um mundo novo dotado de um estilo único, "moderno" e "pós-moderno". Os universos sociais e biológicos, galáxias e cristais, caminham para um estado absorvente. A história tem atrativos. Regida pelo acaso de movimentos de bêbado, caminha, contudo, para estados que aparecem como a "meta da história" em retrospecto — porque as vias alternativas foram destruídas. Ao fazê-lo, apagam-se os rastros das transformações que expressam as possibilidades da natureza humana. Não apenas uma concha ou uma flor, uma sociedade ou uma floresta, mas espécies éticas, gêneros de atitudes perante a vida, famílias de técnicas corporais, filos de conhecimentos e de prazeres — com as simetrias que os revelam como parte do mesmo padrão com que a mente funciona. Ironicamente, é a própria espécie humana o antídoto perverso para a diversidade da qual ela é uma das manifestações.

Uma analogia pode ser apropriada, como pausa. Os marxistas da chamada Escola de Frankfurt, por caminhos completamente diversos, chegaram a um pessimismo similar, paradoxal porque vindo na esteira do entusiasmo marxista pelo mundo novo prometido desde o iluminismo. Esse pessimismo ambíguo, porque combinado a entusiasmo de bricoleur voltado para o passado, é mais claro em Benjamim, e permite melhor um paralelo com Lévi-Strauss. Colagem no primeiro caso; bricolagem no segundo. Benjamim pensava poeticamente e valorizava a metáfora como o dom maior da linguagem. Lévi-Strauss já comparou toda sua análise mitológica a uma vasta metáfora da beleza musical. Não lhe é estranha a idéia benjaminiana de preservar, num momento ameaçado pelo perigo, a imagem miniaturizada de uma herança humana sem garantia de futuro. A sugestão pode ser expressa em palavras célebres de Benjamin:

"Onde aparece para nós uma cadeia de acontecimentos ele — o anjo da história — vê uma única catástrofe que continua a amontoar destroços sobre destroços e os arroja a seus pés. O anjo gostaria de se deter, despertar os mortos e reunir o que foi despedaçado. Mas está soprando uma tempestade no Paraíso e impele-o irresistivelmente para o futuro a que volta suas costas, enquanto o monte de ruínas à sua frente cresce em direção ao céu.""

(Mauro Almeida, em Simetria e Entropia: sobre a noção de estrutura em Lévi-Strauss)

Luar (música de Txai Macedo)

Luar
Vem lá da floresta.
Atravessando os rios,
sobe a serra dourada.
Ilumina a varanda
da minha morada.

Luar
Entra pela janela.
Beija nos lábios dela,
deixa ela acordada.
Fica no travesseiro.
Que saudade malvada!

Se eu fosse esse vento
que anda por dentro
do mato cerrado,
não guardava segredo,
nem mandava recado.

"Nós somos a gente que vive nos rios em que vocês querem construir barragens. Nós somos Munduruku, Juruna, Kayapó, Xipaya, Kuruaya, Asurini, Parakanã, Arara, pescadores e ribeirinhos. Nós somos da Amazônia e queremos ela em pé. Nós somos brasileiros. O rio é nosso supermercado. Nossos antepassados são mais antigos que Jesus Cristo.
Vocês estão apontando armas na nossa cabeça. Vocês sitiam nossos territórios com soldados e caminhões de guerra. Vocês fazem o peixe desaparecer. Vocês roubam os ossos dos antigos que estão enterrados na nossa terra.
Vocês fazem isso porque tem medo de nos ouvir. De ouvir que não queremos barragem. De entender porque não queremos barragem.
Vocês inventam que nós somos violentos e que nós queremos guerra. Quem mata nossos parentes? Quantos brancos morreram e quantos indígenas morreram? Quem nos mata são vocês, rápido ou aos poucos. Nós estamos morrendo e cada barragem mata mais. E quando tentamos falar vocês trazem tanques, helicópteros, soldados, metralhadoras e armas de choque.
O que nós queremos é simples: vocês precisam regulamentar a lei que regula a consulta prévia aos povos indígenas. Enquanto isso vocês precisam parar todas as obras e estudos e as operações policiais nos rios Xingu, Tapajós e Teles Pires. E então vocês precisam nos consultar.
Nós queremos dialogar, mas vocês não estão deixando a gente falar. Por isso nós ocupamos o seu canteiro de obras. Vocês precisam parar tudo e simplesmente nos ouvir."

(tirado daqui, no dia 02/05/2013)

Salas de aula

(fotos de Julian Germain, retiradas daqui)



(em homenagem à Serra do Cipó, que tem a sala mais diversa de todas - a quinta de baixo pra cima)

(download do panfleto: http://www.atoa.net.br/)

#ATOA na terraterra (áudios)

Os áudios das falas da #ATOA no evento terraterra (Casa de Rui Barbosa, 15 de junho de 2012) estão disponíveis no blogue da #ATOA.

TERRATERRA


"Então chegou a vez da ‘descida antropofágica’. Vamos comer tudo de novo”
(aqui)

Money Jungle


Money Jungle - Duke Ellington, Charles Mingus e Max Roach (1962)

Filosofia da devoração

“Tendi e tendo cada vez mais para uma filosofia que chamo de filosofia da devoração. A vida é devoração pura e só há  uma conduta a seguir: o estoicismo. É verdade que outro conceito da existência divide a humanidade. É o conceito messiânico e salvacionista. Os que se enfileiram debaixo dessa bandeira são os que acreditam que há qualquer coisa a salvar dentro deste mundo ou fora dele. O primeiro pensamento é que presidiu a vida das sociedades primitivas tão superiores às sociedades civilizadas. Estas servem-se do messianismo para criar as servidões do corpo e do espírito e as ilusões de toda espécie” (Oswald de Andrade em uma entrevista para a Manchete, 1954).

Nawã pulitikarã III

"Diz-que que um índio veio a Cruzeiro do Sul montado num cavalo. Um nawa, interessado em cavalos, achou bonito o animal, que mesmo magro era vistoso. Resolveu enganar o índio.

- Txai, me vende teu cavalo, eu te compro ele bem.

- Vendo, meu txai. Vendo por quatro mil cruzeiros.

- Queísso, txai, tá caro.

- Tá caro, né? Então não vendo não.

Então o branco pensou: "vou embebedar esse caboclo, que daí ele vende baratinho".

- Peraí, txai, não vai agora não. Bora tomar uma cahcaça?

- Bora.

E os dois começaram a beber. O branco foi servindo para o índio mais cachaça do que ele próprio bebia. Quando o txai estava bem bêbado, ele voltou a perguntar:

- Então, txai, eu sou teu amigo, eu tô aqui te pagando uma cachaça. Vende teu cavalo pra mim...

- Vendo. Vendo na hora. Vendo por seis mil cruzeiros.

- Mas tá mais caro que antes!! Vende então pelos quatro mil mesmo.

- Vendo nada. Se quiser é seis mil cruzeiros.

- Mas por que?

- Porque eu ia vender meu cavalo pra tomar uma. Agora que eu estou bêbado eu só vendo se for pra comprar um motor".

 

Produzir ou morrer (ou 1974 p.II)

"Atualmente, em toda a América do Sul, os últimos índios livres sucumbem sob a pressão enorme do crescimento econômico, brasileiro em particular. As estradas transcontinentais, cuja construção se acelera, constituem eixos de colonização dos territórios atravessados: azar dos índios com quem as estradas deparam! Que importância podem ter alguns milhares de selvagens improdutivos comparada à riqueza em ouro, minérios raros, petróleo, em criação de bovinos, em plantações de café, etc.? Produzir ou morrer, é a divisa do Ocidente".

(Pierre Clastres, "Do Etnocídio", em Arqueologia da Violência)

Metafísica reversa

O crente, fazendo proselitismo, perguntou:

- Deus sem você é Deus. E você sem Deus, o que é?

Ao que o txai kaxinawa respondeu:

- Hum... Você?