"Uma cena de encantamento mágico"


"Estávamos em dia de lua cheia. Urse subia no horizonte na mesma hora em que Wari, o sol, desaparecia no ocidente. Havia sido preparado também fumo torrado reduzido a pó misturado com cinza. Quando a lua apareceu a cerimônia começou. É uma cerimônia que se desenrola sem cerimônias, se podemos nos expressar assim para dizer que tudo aconteceu simplesmente. Os assistentes formavam um meio círculo em volta da bebida sagrada e do pequeno pote de fumo. Armado de um longo pecíolo oco de folha de mamoeiro, que parece um tubo rígido de borracha, o índio que fazia o papel de servente derramava um pouco de fumo na cavidade da mão, introduzindo uma pequena dose na extremidade do tubo, que os pacientes pegavam e levavam até uma de suas narinas. O servente soprava com força e o pó de fumo penetrava no nariz. Baixando então o tubo da sua narina para sua boca, o paciente soprava na boca do servente, assobiando de maneira muito especial, seguindo as instruções da Grande Serpente. O servente fazia uma leve careta e o paciente parecia sofrer atrozmente, mas o tratamento recomeçava três vezes, de maneira a introduzir duas doses em cada narina. Parece que é um excelente remédio contra a coriza.

Então Mame preenchia uma pequena cabaça de suco de honé e de kawa, soprava sobre ela, para que não fizesse nenhum mal ao paciente, e este o absorvia de uma vez, após o que ele devolvia a Mame o minúsculo vaso sagrado, fazendo uma careta horrorosa e soprando com barulho como que para se aliviar de um grande sofrimento.

Cada um dos celebrantes tomava tanto quanto podia, porque era necessário acabar com a bebida preparada, mas enquanto que um não pôde suportar mais do que quatro doses, e os outros, cinco, Mame engoliu sete, e foi o último a cair em estado de abobamento ou de embriaguez.

Neste momento, um grande silêncio reinou no acampamento. Os índios pareciam mergulhados num sono obsessivo. Eles não respondiam mais às perguntas que eu lhes fazia. Eram nove horas, a cerimônia já tinha durado cerca de três. O servente foi dormir, assim como todas as mulheres do acampamento, menos a mãe de uma criança doente, que Mame iria curar. Do mesmo modo que os Katukina, os Wani-nawa não dormem na choupana: eles passam a noite em abrigos especiais, impenetráveis pelo ar e pelos mosquitos. Estes abrigos estão distribuídos ao longo das bordas da floresta, a uma certa distância uns dos outros.

Havia um quarto de hora que durava o silêncio, só se escutava o coaxar das rãs, o canto dos grilos e a escala descendente do coruja parda uivadora, que tem o misterioso nome de "mãe da lua". O astro das noites, em todo o seu esplendor, iluminava do céu sem nuvens as cinco estátuas vivas, mas paralisadas, que se mantinham agachadas, com a cabeça entre as mãos. Andei em todos os sentidos dizendo o meu rosário.

Repentinamente, uma voz estranha aflautada se elevou, muito alta e melodiosa, o que me fez sobressaltar. Ela dizia frases ritmadas cujos versos terminavam em i.

Aproximei-me do grupo imóvel. Era Mame quem cantava; mas ele parecia estar em êxtase.

- "O que é que ele canta?" perguntei a um índio.
- "Não sei! disse ele, eu não sou feiticeiro!"
- "Então você não entende a sua própria língua?"
- "Não é na minha língua que ele canta!"
- "Que língua então?"
- "Não sei ! Além disso não é ele quem está cantando!"
- "Quem então?"
- "É a Grande Serpente que entrou nele!"

A Grande Serpente falava tão rápido, mas tão rápido, que era-me impossível escrever tudo, ainda mais que eu só tinha a lua para me iluminar. Escutei então, encantado, a voz harmoniosa daquele que enganou a nossa mãe Eva, nos pomares do Éden. Mame lhe emprestava a garganta, a língua, os lábios, mas evidentemente ele não estava aí para nada. A sua cabeça estava beatamente inclinada sobre o seu ombro esquerdo, os seus olhos estavam fechados, a sua alma estava no céu!"
(Tastevin, em 1924, entre o grupo de Mame, pajé Katukina - no livro: Tastevin, Parrissier, org. M. Carneiro da Cunha, editado pelo Museu do Índio, FUNAI RJ)

Nunca antes na história desse país se viu tanta gente na cadeia

Dados divulgados hoje na Folha de São Paulo (jornal indigesto, mas por vezes útil) mostram que a população carcerária do país dobrou nos últimos nove anos. Diz a Folha que o aumento é impulsionado pelo crescimento do número de presos provisórios, que aguardam julgamento. Segundo os números do Departamento Penitenciário Nacional, e do Conselho Nacional de Justiça, já são 473 mil detentos. São 167.046 pessoas a mais do que a população de Rio Branco, Acre. Ou, pros amigos do sudeste, é como se cerca de 20% da população de Belo Horizonte estivesse na cadeia. Quase metade desses presos estão no xilindró por atentado à propriedade privada alheia.

É impressão nossa ou os brasileiros estão sentados sobre um barril de pólvora aceso?

ps:
"O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgou em fevereiro um estudo estatístico sobre a situação carcerária no país. Não existe nada a comemorar. Os dados são vergonhosos, principalmente para os Estados.

Coletados em dezembro de 2009, informam que o Brasil possui 473.626 presos, sendo 264.500 condenados e 209.126 provisórios.

O estado com maior concentração de presos é São Paulo (163.915), seguido de Minas Gerais (46.447) e Paraná (37.440).

Já o estado com a maior taxa de encarceramento é o Acre (com 496 presos para cada 100 mil habitantes), seguido de Rondônia (465) e Mato Grosso do Sul (459).

O estudo indica ainda que a população carcerária do Acre é de 3.426, sendo 33% de presos provisórios.

A maioria dos presos do Acre é formada por jovens que se envolveram em crimes decorrentes do consumo ou tráfico de cocaína, um problema que permanece sendo ignorado pelas autoridades de Estado que faz fronteira com o Peru e a Bolívia.

A população carcerária da capital do Acre é formada por 2.794 detentos. A Unidade Penitenciária Francisco D´Oliveira Conde abriga 2.409; a Unidade Penitenciária Antonio Amaro Alves 120; e a Unidade Penitenciária-4 265, sendo 36 em sistema fechado e 229 em semiaberto."
(no Blog do Altino)

Tupac Amaru II

José Gabriel Condorcanki Noguera Tupac Amaru, filho do curaca Miguel Condorcanki e Rosa Noguera, descendia por linha materna de Juana Pilcowaco, filha do último inca Tupac Amaru, que fora executado pelo vice-rei Toledo na praça de Cusco 1572. Nasceu em 1740 ou em 1741, na província de Tinta, onde seu pai foi governador. Era o segundo filho, mas com a morte do primogênito Clemente, José Gabriel acabou herdando o cacicado paterno. José Gabriel estudou no Colégio de Caciques de São Francisco de Borja, em Cusco. Parece que, ao passar um tempo em Lima, José Gabriel frequentou também o curso de Artes da Universidade de São Marcos.

Terminados seus estudos, foi nomeado cacique dos territórios antes controlados por seu pai, e fixou residência na cidade de Cusco, de onde viajava para controlar e governar as terras cuja administração lhe estava entregue. Casou-se em 1758 com uma jovem cusquenha, Micaela Bastidas Puyucahua, mulher de temperamento e personalidade forte, nada submissa e muito inteligente. Com ela teve três filhos homens.

Como herdeiro de uma família abastada e prestigiosa, José Gabriel era rico. Dentro de sua propriedade estavam campos imensos de coca, minas e terras férteis. Mas José Gabriel ganhava dinheiro mesmo com o transporte de cargas, pois ele contava com cerca de 350 mulas que viajavam de Cusco até o Alto Peru - Bolívia.

Sabe-se que o sistema colonial da época contava com uma rede de corregedores e caciques, que garantiam o seu funcionamento administrativo e disciplinar. Os corregedores eram autoridades espanholas, que vinham representar o rei de Espanha na província - deviam legislar sobre questões de justiça e questões civis, e tinham a função de arrecadar os tributos quatrimestrais que deviam depositar nos cofres reais. A partir do século XVIII, os corregedores obtiveram também a permissão para comercializar em suas respectivas províncias, "para o benefício e comodidade dos índios". Os caciques eram os antigos curacas do sistema incaico, recrutados agora pelo rei de Espanha para "azeitar" a dominação. Ajudavam na cobrança de tributos e a reunir índios para trabalhar nas mitas e nas minas. Para isso ganhavam um salário. Só os índios podiam ser caciques, não os espanhóis ou mestiços: trata-se de um cargo que se transmitia por hereditariedade. Os índios tinham vínculos de obrigação para com o seu respectivo cacique, e a lei só obrigava a pagar-lhes o trabalho no caso de trabalho que se dirigiam para fora, ou para o lucro da coroa. A solidez desse sistema repousava pois no antigo sistema indígena dos Andes peruanos. Esses caciques e seus decendentes com direito de sucessão eram educados em centros especiais, os Colégios de Caciques, em Lima e em Cusco.

Dada a natureza da economia colonial, é óbvio que existiam infinitos abusos de poder, e claro que havia uma super-exlporação dos índios, que constituiam a força de trabalho da época. Mas, curiosamente, ao contrário do que nós poderíamos pensar, parece que não havia, por parte dos índios, um necessario descontentamento com o sistema em si, mas apenas com os abusos mais exagerados que ocorriam.

Assim, José Gabriel Tupac Amaru não estava muito contente com os pesados impostos que devia pagar, e também estava preucupado com a pressão que sofria para abrir mão do monopólio dos transportes de minérios pelo Alto Peru - objeto de cobiça dos arrieiros argentinos. As autoridades espanholas passaram a obrigar Tupac Amaru a pagar mais impostos, e a recrutar seus índios para a mita nas minas, em favor da Coroa e sem receber bem por isso. Diante disso, Tupac Amaru apresentou um processo formal na Real Audiência de Lima, para liberar os índios do trabalho da mita. Como a decisão da audiência foi negativa, José Gabriel Tupac Amaru ficou meio ressentido com o sistema, e voltou pra casa bem insatisfeito.

Pois bem, essa insatisfação se dirigia a esta situação específica, e não ao sistema de dominação em si. Aos impostos excessivos, à mita obrigatória e ao abuso dos corregedores se somou ainda a repartição das terras de Tupac Amaru por razões administrativas, que na prática tirava da família Condorcanki bons pedaços de terra. Essa insatisfação crescente foi o estopim da maior insurreição na história do Virreinato peruano. Trata-se de uma insurreição que a princípio era apenas reformista: a rebelião reconhecia a autoridade da Coroa Espanhola, e apenas exigia mudanças na administração da colônia. A revolta começou com a prisão e a posterior execução de um corregedor abusado da província de Tinta, em 4 de novembro de 1780. É quando começa a rebelião que José Gabriel adota o nome de Tupac Amaru II, para usufruir do peso simbólico de sua ascendência inca.

Como toda rebelião, essa toma vida e segue caminhos próprios, e se distancia de seu propósito orginal: era uma revolta reformista, mas acaba ganhando uma conotação étnica, e ganha também um caráter mais insurrecional. A mulher de Tupac Amaru, Micaela Bastidas, vai exercer um importante papel como vice-liderança da insurreição, e, segundo o livro que digerimos antes de excretar essa postagem, foi por não seguir um conselho dela que Tupac Amaru acabou perdendo a guerra.

Depois de vencer uma batalha contra um grande exército espanhol em Sangarara, as forças da colônia estavam desbaratadas, e a população em Cusco estava em pânico. Mas alguns caciques que eram leais à Coroa reuniram forças e planejavam atacar o exército de Tupac Amaru. Tupac Amaru resolve então confrontá-los, com a esperança de ganhar a batalha e conseguir ainda mais armas e homens para atacar Cusco. Micaela se opunha a essa tática. Para ela, devia-se atacar Cusco de imediato, aproveitando o pânico da população e o caos instaurado para tomar o centro do poder colonial. Assim, de supetão e no susto, a maioria colonial em armas e chefes não se faria sentir tanto no campo de batalha, pelo peso psicológico que ainda ficara da batalha de Sangarara. Tupac Amaru, ao decidir contrapor-se à reação que se organizava pelo caciques do sul de Tinta primeiro, e atacar Cusco depois, deu tempo para a defesa colonial se organizar e receber mais reforços vindos de Lima, Arequipa e Huamanga.

Assim, em 8 de janeiro de 1781 Tupac perde uma batalha rumo a Cusco. Perde assim a iniciativa, e passa a ficar somente na defesa, cada vez mais acuado (que nem no xadrez). As tropas realistas perseguiram o exército tupacamarista, enfrentando-o em 5 e 6 de abril, em Tinta. Foi um massacre. Os principais dirigentes da rebelião foram presos. Em maio de 1981, Tupac Amaru II foi obrigado a presenciar a execução de toda a sua família. Ele então foi esquartejado e sua cabeça foi colocada na ponta de uma lança e exibida em Cusco e em Tinta, seus braços foram exibidos em Tungasuca e Carabaya, e suas pernas foram levadas para Levitaca e Santa Rosa.

(postagem baseada no livro La Rebelion de Tupac Amaru, de Daniel Valcarcel).

A origem do rio Juruá, o rio de mais meandros do mundo

"Num passado bem distante, pré-histórico sem dúvida, vivia no Purus, rio que corre paralelamente ao Juruá, uma cobra que se chamava Cobra Grande, Mãe d'Água. Ora, aconteceu que um dia a Cobra Grande soube, por alguma má língua, sem dúvida há delas em toda parte, que no calmo lago de Yainu existia uma cobra mais poderosa do que ela. Não foi preciso mais do que isso para estimular a sua curiosidade, ferir o seu orgulho e excitar a sua inveja. É o que vou ver agora, disse a Cobra Grande, colocando-se resolutamente em marcha para se medir com a sua adversária, que se chamava Honorata. Não nos dizem quanto tempo ela demorou para chegar lá, mas ainda assim ela chegou um dia, com orgulho e desprezo, às margens do lago Yainu. (...)

Honorata tinha na ponta de sua linha um magnífico peixe-boi e se preparava para comê-lo quando subitamente viu a Cobra Grande do Purus aparecer. Abandonando imediatamente o seu rico butim, Honorata, mal dissimulando o seu descontentamento, perguntou à importuna quem ela era, e o que lhe valia a honra de uma visita, que ela tão pouco esperava. Cobra Grande lhe respondeu: 'sou a Cobra Grande do Purus, a mãe d'água, e, por isso, única rainha das águas deste território e que na sua insolência você finge desconhecer. Mas me apresentar a você não é o único objetivo da minha viagem. Ainda tenho que lhe perguntar, Honorata, com que direito você se estabeleceu nesta parte dos meus domínios, sem ao menos se dignar a pedir a minha autorização (...)'.
Não foi com pouco esforço que Honorata escutou este longo e insolente discurso da Cobra Grande, porque, a cada palavra, Honorata se sentia ofendida, sentia nascerem nela todos os instintos belicosos e também ferver a mais terrível das iras. Assim, quando a Cobra Grande se calou, ela fez com que fossem escutados os seus assobios assustadores, como os que produziam as 135 sirenes dos 135 vapores da companhia do Lloyd, que apitavam ao mesmo tempo; uma imensa onda de espuma esverdeada, parecida com um rio fervendo, escapou de sua goela, e os seus olhos lançavam raios, como as tempestades mais famosas nenca chegaram a produzir. Todo o território tremia em fogo. No entanto, Honorata, tendo se recomposto um pouco, respondeu com estas palavras a Cobra Grande: 'quem quer que você seja, Cobra Grande do Purus, ou gênio das águas, não estou nem um pouco preucupada. Concedo-lhe não as qualidades necessárias, mas a liberdade de se gabar do título que lhe aprouver: agora, querer mandar na minha casa, vir me insultar e me provocar, eis o que eu não vou permitir nunca (...)'.
Honorata tendo assim falado, obteve a resposta de Cobra Grande, que consistiu numa gargalhada formidável, que fez tremer a floresta. (...) Assim, não podendo mais suportar estas insolentes provocações, Honorata se jogou sobre Cobra Grande. O choque foi assustador, Cobra Grande recebeu este primeiro e terrível choque razoavelmente bem, então Honorata enlaçou-a com suas dobras e redobras, pegou-a pela garganta, e, em menos tempo que é preciso para dizê-lo, levara Cobre Grande ao seu limite. Este combate foi curto, mas terrível e decisivo, um verdadeiro cataclisma. (...) O barulho infernal que faz o Chimborazo em erupção não é nada em comparação com o estrondo assustador que se ouviu então dos Andes ao Atlântico. Eram os gigantes da floresta que, agarrados pelos anéis dos dois combatentes, quebrados como frágeis galhos, caíam com um estrondo aniquilador e quebravam tudo na sua queda. A própria terra tem marcas que serão para os séculos futuros os testemunhos irrefutáveis desta luta terrível entre Honorata e Cobra Grande. A rainha do Purus, vendo-se a ponto de perder a vida, aproveitou um momento para se soltar do terrível abraço de Honorata e fugiu toda envergonhada para engolir a sua vergonha e verter a sua bílis no Purus, onde ela evitou falar do seu fracasso. Honorata, orgulhosa de sua força e bravura, vendo a Cobra Grande fugir, olhava à sua volta. Mas qual não foi o seu espanto ao constatar que o seu tranqüilo domínio, o lago Yainu, não existia mais, ele se transformara num imanso rio com sinuosidades de cobra. Era simplesmente o Juruá, que a própria Honorata acabara de cavar ao lutar, e o lago, rompendo os seus diques, tinha deixado correr as suas águas na trilha traçada pelo corpo da cobra. Desde essa época, diz a história, Honorata vive tranqüila à sombra dos seus louros, deitada no leito do Juruá, orgulhosa de ter vencido a maior, mais poderosa e também a mais pérfida cobra da Amazônia, feliz também de ter aberto para a navegação nacional uma nova via que traz riqueza e abundânica para a sua região natal. Honorata pode, de fato, viver orgulhosa e feliz no seu domínio do Juruá, e aceitar, sem cerimônia, o reconhecimento de todos os amazonenses, seus devedores".
(Jean-Baptiste Parrissier, "Seis meses no país da borracha, ou excursão apostólica ao rio Juruá", 1898 - no livro: Tastevin, Parrissier, org. M. Carneiro da Cunha, editado pelo Museu do Índio, FUNAI RJ)

Marco civil da internet no Brasil

Está na rede o anteprojeto de lei que visa regulamentar o uso e a difusão da internet no Brasil. Trata-se do "marco civil da internet no Brasil", que está sendo construído colaborativamente, i.e., qualquer pessoa pode ler e acrescentar comentários no texto da lei. Segundo o governo, o "formato da consulta, em si, pretende estimular a participação da sociedade e reconhecer a relevância de suas contribuições, tanto na definição da abrangência da norma quanto de sua redação final. Busca-se, portanto, ampliar o conceito de participação popular e de democratização do processo legislativo, a partir do uso cidadão de tecnologias de informação e comunicação".

Dentre os temas que são abordados na discussão do marco civil, incluem-se regras de responsabilidade civil de provedores e usuários sobre o conteúdo postado na internet e medidas para preservar e regulamentar direitos fundamentais do internauta, como a liberdade de expressão e a privacidade. A discussão não aborda temas que vêm sendo discutidos em outros foros e que extrapolam a questão da internet, como direitos autorais, crimes virtuais, comunicação eletrônica de massa e regulamentação de telecomunicações, por exemplo.

Todo usuário assíduo da internet deveria ao menos passar o olho no texto, pra ficar sabendo o que vem por aí... A discussão pode ser acompanhada no link: http://culturadigital.br/marcocivil/.

Tinha que ser o Chávez mesmo!

Hugo Chávez lançou mais um controverso programa em seu governo de esquerda: a guerrilha comunicacional. Trata-se de um programa piloto, que forma e apóia pequenos grupos de jovens alunos das escolas públicas para produzir conteúdos para veiculação em vídeo, rádio e impresso (são os "Comandos da Guerrilha Comunicacional"). A idéia é simples e efetiva: incentivar a meninada com talento pra produzir mídia com inspiração de esquerda, em contraposição à imprensa monopolista privada. O interessante no caso da Venezuela é o paradoxo: uma forma de arte pop, que faz um uso mercadológico e irônico da imagem, e que sempre foi contra o estado, sendo utilizada pelo estado esquerdista contra a iniciativa privada.

Hoje é muito fácil produzir imagens e sons para circularem na internet e etc. Se continuamos reféns de um jornalismo de péssima categoria (vide a cobertura que a imprensa deu pro caso do Glauco, p.ex.), é só por preguiça de procurar fontes alternativas de notícias. Na verdade, existe uma imensa rede de jornalismo alternativo latino-americano, muito pouco conhecida por nós brasileiros. Aliás, creio que qualquer pessoa que viaja pela América do Sul hispanoparlante-quechuaparlante-aymaroparlante-guaraniparlante-etcparlante pode sentir o quanto nós brasileiros estamos excluídos de um movimento geral de integração dos povos filhos dessa nossa terra. Parece que no Brasil estamos mais interessados em assistir "Avatar" e nos emocionar com aquela pseudo-insurgência ecológica e burguesa do que olhar pro que está acontecendo nos países nossos vizinhos... Temos mais simpatia por aqueles bons-selvagens digitais do que pelos índios reais que estão bagunçando com o capitalismo na Bolívia.

(obs: aliás, no Avatar, quando o general careca-cabra-macho está dando uns toques no carinha de cadeira de rodas, ele alerta que ali a experiência de guerra seria muito pior do que na Venezuela... o próprio heróizinho do filme, o mesmo carinha de cadeira de rodas, também dá a entender que teria ficado aleijado na Venezuela...)

Aí do lado fica o Simon Bolívar com spray na mão (imagem tirada do blog http://guerrillacomunicacional.blogspot.com/).

Homens Trabalhando



No alto, a ilha de Chipre vista da estação espacial e o ônibus espacial Discovery; acima, astronauta Clayton Anderson, que ontem precisou usar um martelo para colocar um rebite que impedia instalação de um novo tanque de amônia no complexo (fonte: Folha de São Pulo, caderno Ciência, 12-04-2010).


- + - + - + - + -de--s+e+n+v+o+l+vimento

“Racionalização da produção, tecnologia, construção planejada – sim, se por detrás dessa construção ‘brilhar com verdadeiro amor terrestre o olho entreaberto do futuro’; não – se essa construção for o apego egoísta aos dias de hoje. Sob esta orientação, a grandiosa tecnologia transforma-se ‘no mais perfeito aparelho do provincianismo e da bisbilhotice em escala mundial’ (‘Minha descoberta da América’). É desse provincianismo planetário que, no ano de 1970, em O Percevejo, a vida está saturada: uma organização racional, sem ímpeto, sem condensações supérfluas de energia, sem devaneios. A revolução social do mundo foi concluída, mas a revolução do espírito ainda está pela frente. A peça é um tácito panfleto contra os herdeiros espirituais daqueles tristes juízes que, numa sátira do jovem Maiakovski, ‘invadiram o Peru sem saber direito nem por quê, nem pra quê’”.

(R. Jakobson, comentando Maiakovski, em “A geração que esbanjou os seus poetas”, 1931)