desmentindo

"a vida só se organiza se desmentindo, o que é bom para uns é muitas vezes a morte para outros, sendo que só os tolos, entre os que foram atirados com displicência ao fundo, tomam de empréstimo aos que estão por cima a régua que estes usam pra medir o mundo”

Raduan Nassar

Alô meu Acre



Alô meu Acre, meu torrão querido,
eu tenho sofrido uma saudade imensa
por viver distante da minha cidade
amargo a saudade na minha presença
vai minha homenagem a Tarauacá
Senador Guiomard, Feijó e Rio Branco
Plácido de Castro, Sena Madureira
Gente hospitaleira que eu gosto tanto
Vou a Xapuri e volto por cima
Vou a Mâncio Lima e Assis Brasil
Cruzeiro do Sul, cantando desfaço
Vai o meu abraço pra todo Brasil




(música cantada por Osmildo Kuntanawa em uma noite de cipó)

internet

"comessei ver no horizonte uma frecha de luz desse mundo maluco de informaçâes que é a internet. um dia alcansarei. è, um dia!"

Reginaldo Xakriabá (mensagem de e-mail recebida em 22/05/2007)

Batalha entre floresta e gado na Amazônia

 

      gregoriovaca

"“Agarre na mão de Deus”, disse sua mãe ao falecer. Só mais tarde compreendeu que ela, enquanto agonizava com falência dos rins, o exortava a continuar seu trabalho de evangelização católica.

Era 1980, e viviam isolados no seringal de Iracema, como uma grande família formada por dezenas de adultos, meninos e meninas, sobrevivendo do que a selva amazônica oferecia e da venda de látex natural extraído da seringueira.

Aldeci Cerqueira Maia, o “Nenzinho”, tinha 18 anos e havia se casado há pouco quando sua mãe morreu. Extrator de borracha desde os nove anos, guarda até hoje, “como um talismã”, uma das primeiras pelotas que fez com esse produto. Seus avós foram “soldados da borracha”, levados do Nordeste para a Amazônia durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) para abastecer de borracha os exércitos aliados.

Mais tarde, o Estado do Acre começou a receber novos visitantes interessados, não nos frutos da floresta, mas em derrubá-la e implantar a pecuária e alguma plantação. Os assentamentos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) restringiam o seringal. Quando, em 1986, o Incra se preparava para ocupar parte dos seringais para assentar os agricultores, os cultivadores de borracha ameaçados de expulsão uniram-se no “empate”, uma forma de resistência pacífica que levou multidões a se opor ao desmatamento.

“Conseguimos parar a expropriação do Incra”, disse Nenzinho, mas foi preciso uma longa luta até que o triunfo se formalizasse na criação da Reserva Extrativista (Resex) Cazumbá-Iracema, em 2002. Resex é uma área de proteção ambiental onde seus moradores tradicionais têm direito ao uso sustentável dos recursos naturais e benefícios como subsídios ao preço da borracha. Esta foi a vitória do “empate”, um invento de Chico Mendes, herói dos povos da floresta amazônica, no qual os seringueiros formavam barreiras humanas para impedir o corte da floresta.

Mas a criação dessas reservas custou sangue e conflitos. Chico Mendes foi assassinado em 1988 por pecuaristas em Xapuri, cidade do leste do Acre. Oito anos antes, já haviam matado Wilson Pinheiro, outro líder de seringueiros e trabalhadores rurais. O primeiro legado de ambos foi a criação, em 1990, da Resex Chico Mendes, com 970.570 hectares, onde vivem hoje cerca de 1.800 famílias.

Nenzinho sobreviveu a duas ameaças de morte, uma delas por ter denunciado um delegado por caça ilegal. Mas sempre contou com a proteção e o apoio do padre Paolino Baldassari, cura italiano já octogenário mas ativo, que formou gerações de ativistas católicos e animou todas as lutas dos pobres em Sena Madureira, município sede da Resex Cazumbá-Iracema.

O sucesso da resistência do seringal Iracema e de sua própria liderança, Nenzinho atribui à pregação religiosa iniciada por sua mãe e seguida por ele, sempre sob orientação de padre Paolino. “O ser humano não vive apenas de pão, e tampouco só de oração”, disse ter aprendido Nenzinho, que decidiu também cuidar da saúde de seus vizinhos, capacitando-se como agente sanitário e depois enfermeiro.

As visitas frequentes a todas as famílias locais o fizeram padrinho de meninos e meninas de 56 famílias. “Era compadre de todos”, contou. Porém, uma brutal queda no preço da borracha na década de 1990 ameaçou desfazer sua comunidade. Muitos abandonavam o seringal. Os persistentes criaram uma cooperativa e Nenzinho, com as facilidades de agente de saúde da prefeitura, transportava a produção de todos para vender na cidade, fazendo com que economizassem custos e tempo.

O transporte por animais demorava quase um dia inteiro, já que não havia estradas, apenas caminhos escorregadios quando chovia. Em 1992, o preço caiu mais ainda e “não havia compradores”. Nenzinho decidiu salvar um mínimo da comunidade convidando dez famílias a se somarem à extração de castanha com o que ele e seus parentes conseguiam alguma renda, graças à sorte de viver junto a um grande castanhal. Como a colheita de castanha se limita ao primeiro trimestre, também recorreu ao cultivo de arroz, feijão, banana e outros alimentos no restante do ano.

“Foi difícil” mudar os hábitos de extratores acostumados à carne de caça. “Tivemos que aprender a comer outras coisas. Eu mesmo precisei me domesticar”, admitiu Nenzinho. Outro triunfo foi a abertura de um ramal viário até a Resex, “uma missão impossível, mas realizada”. Em 1997, chegou o primeiro automóvel, entre choros “de emoção”, contou. “O transporte é tudo”, afirmou, embora a terra escorregadia impeça o tráfego de veículos a maior parte do ano.

Cazumbá-Iracema também foi a “primeira comunidade extrativista a ter ensino médio no Acre”, destacou orgulhoso. São 15 alunos no secundário e 96 no ensino primário, informou a professora Algecida Cerqueira, em sua casa de madeira, no povoado principal da Resex. “Nasci aqui e fundei a escola em 1993”, contou, dizendo que a juventude “quer ficar aqui”, ao contrário dos filhos de camponeses assentados nos arredores. Um exemplo é Ronaldo Santos, de 18 anos, que pensa em estudar biologia em alguma cidade e depois voltar para pesquisar “a floresta cheia de mistérios”.

Finalmente, em 2002, o governo federal decretou a criação da desejada Resex Cazumbá-Iracema, com 750.975 hectares. Isso lhes dá subsídios que elevam para R$ 3,20 a renda obtida por um quilo de borracha, 2,7 vezes o preço do mercado, mas equivalente a apenas um terço do poder de venda de 1980, segundo Nenzinho. O seringueiro hoje cuida de sua Resex como funcionário do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, órgão do Ministério do Meio ambiente encarregado das unidades de conservação, como Resex, Parques e Florestas Nacionais.

A população local aumentou para 320 famílias que, para melhorar sua renda, tentam diversificar a produção. Além da castanha e da pequena agricultura, desenvolvem o artesanato, especialmente com o emborrachado, de látex com o qual fazem grandes pinturas e mouse pads em forma de árvores amazônicas. Na Resex Chico Mendes já se usa o látex para fabricar camisinha e a “folha defumada”, espécie de couro vegetal usado para fazer calçados.

Contudo, parece insuficiente. Há dois anos foram descobertas milhares de cabeças de gado e uma grande área desmatada na reserva, violando os objetivos da área protegida. O Incra executou no Acre projetos de “colonização” e criou assentamentos causando um amplo desmatamento ao longo das estradas nas décadas de 1970 e 1980, mas depois mudou sua forma de atuar, incorporando a dimensão ambiental e aproximando-se do espírito das Resex, explicou João Ricardo de Oliveira, chefe de Planejamento do Instituto no Estado.

O objetivo do regime militar da época era ocupar a Amazônia, com a filosofia de “integrar para não entregar” a soberania da região, e também assentou milhares de deslocados por projetos hidrelétricos no sul, sem nenhuma preocupação ambiental, explicou. No Acre chegaram menos deslocados do que no vizinho Estado de Rondônia, que foi um exemplo negativo do amplo desmatamento e disseminação da malária.

Agora, procura-se criar uma Zona Econômica Ecológica no Acre, e os assentamentos evitam áreas de floresta nativa ou são feitos de forma sustentável, assegurou. O novo modelo será testado logo no assentamento dos “basivianos”, camponeses brasileiros expulsos da faixa fronteiriça com a Bolívia. “Temos uma lista de 417 famílias”, disse João Ricardo."

Texto de Mario Osava, no laço: http://www.brasildefato.com.br/node/4580

Fórum da Cultura Digital Brasileira 2010

De 15 a 17 desse novembro acontece o Fórum da Cultura Digital Brasileira 2010, em São Paulo.

Pra quem tá perto, vale ir lá ver alguma coisa. Pra quem tá longe, vamos acompanhar pela rede...

Mais informações no laço: http://culturadigital.br/forum2010/

Entre extirpar o Dem(o) e erradicar a pobreza

lula

Em campanha pra Dilma, Lula disse em um comício que o Dem(o) deveria ser extirpado da política brasileira. A sentença do presidente causou furor na rede, principalmente à direita, pois declarar assim em público o desejo de extirpar um partido político soa meio agressivo. Alguns se apressaram em declarar que Lula, apoiado em um índice de aprovação popular monstruoso e nas pesquisas de intenção de voto que davam à sua candidata a vitória ainda no primeiro turno, colocava suas garras de fora. Isso se soma a esse papo (furado) de que o governo é contra a liberdade de imprensa e etc. - imagine, num país onde todos os jornais e revistas de maior circulação se colocam a serviço da desmoralização do presidente e da calúnia contra o seu partido e os seus membros... Lula fez como o capitão de um time de futebol seguro da vitória, que vira para os seus 10 companheiros no vestiário antes da partida e diz: "vamos acabar com eles".
A frase de Lula, pronunciada de uma maneira pouco cuidadosa, na verdade traduz a certeza de que o espectro partidário brasileiro vai se transformando, mas pela via das urnas. Com efeito, pelo que tudo indica, a oposição Dem(o)-PSDB sai dessas eleições enfraquecida, e terá que passar por uma reestruturação. Nesse processo, dizem alguns, Aécio talvez seja fortalecido, talvez pela pretensa capacidade de indicar um caminho moderado de oposição ao governo petista. O fato é que toda uma ala à direita da política brasileira, apoiada pela grande mídia, levou uma surra considerável nessa disputa presidencial de 2010.
Há menos tempo, no evento comemorativo da capitalização da Petrobrás, na Bovespa, Lula disse que a descoberta do pré-sal e a capitalização para a sua exploração permitirão à Petrobrás ajudar a “erradicar de vez a pobreza do nosso povo, garantir educação pública de qualidade a todos os filhos da nossa terra”. Lula tem motivos para comemorar, porque conseguiu em oito anos estruturar um Estado superavitário que distribui renda, e que promove a "inclusão" de milhares no ensino superior e etc. Num paradoxo que não escapa ao humor de nosso presidente, o maior socialista brasileiro do século XX conduziu um governo que transformou o país na maior economia capitalista da América Latina. “Um estado fraco nunca foi sinônimo de iniciativa privada forte” disse o presidente.
Nos parece que em seu melhor e em seu pior uma parte dos oito anos de governo Lula podem ser compreendidos entre as duas coisas: extirpar o Dem(o) e erradicar a pobreza. Sem dúvida, é sob a batuta de Lula e de seu governo que o Brasil vem mudando, se transformando em um país fundamentalmente menos injusto, quando comparado ao que era há quinze ou vinte anos atrás (pra não recuar mais). Hoje, o "partido republicano" brasileiro, formado pelos Dem(o)s, psdbistas e etc., e pela grande imprensa, não tem mais a força hegemônica que tinha. Assim como um ex-operário pode ser presidente, muitos milhares de brasileiros das classes C e D não estão mais alijados da política nacional, e parecem expressar em suas intenções de voto a convicção de que o Estado, mais do que ser um agenciador de negócios particulares, deve propor programas-escada-rolante, capazes de conduzir cada brasileiro ao andar de cima da estratificação social. Se o Dem(o) for erradicado, não será pela violência de um presidente eleito, mas pelo peso e atraso dos pressupostos de sua política. Uma grande parte do eleitorado brasileiro sabe hoje identificar os candidatos que lhes oferecem um projeto de país, e optam pelo prospecto de um governo que parece ser capaz de distribuir renda, de universalizar o acesso a crédito, de universalizar o ensino superior, etc. Ou seja, ninguém vai conseguir se manter na política apenas comprando voto barato, ou coagindo as pessoas e deturpando a história com jornais manipulados, para, quando eleito, se dedicar a excluir e a segregar, mantendo no poder apenas quem ali já estava. Com certeza 2010 marca o início do enfraquecimento dessas formas anacrônicas de fazer política.
O sucesso da política econômica do governo Lula ("o último a entrar na crise e o primeiro a sair dela", como a Dilma gosta de dizer) garantiu a expansão sem precedentes das universidades federais e das escolas de cursos técnicos e tecnológicos, o boom da construção civil (que emprega e garante facilidades para a compra da casa própria), os infindáveis editais de projetos do Ministério da Cultura, etc., etc., etc... A internet tá cheia de exemplos dos sucessos do governo Lula, e não precisamos multiplicá-los aqui. O fato é que tudo conspira para a realização da promessa do presidente: a redução drástica da pobreza no Brasil.
Pois bem, que sumam o Dem(o) e a pobreza. E boa sorte à nossa primeira presidenta.
Agora, devemos notar uma outra novidade trazida por esse ano eleitoral: a terceira candidata, caboclinha da floresta, Marina Silva, que parece ter carregado com seus 20 milhões de votos uma parte das críticas inteligentes ao governo Lula. Pois cabe ao PT compreender a mensagem da Marina, e não diminuir o recado dado por ela de uma maneira muito clara: não faz sentido continuar reproduzinho formas anacrônicas de produzir.
Na nossa opinião, a grande crítica que deve mobilizar uma oposição razoável a esse governo passa pela urgência em se discutir mais profundamente onde queremos chegar. Pois, junto com erradicar a pobreza, vai o seu contrário: fomentar a riqueza. Mas qual riqueza? Nesse ponto, Dilma parece bem próxima de nosso presidente: "por isso que eu considero que erradicar a pobreza é um elemento fundamental(...). Quero um país de classe média" (debate dos candidatos a presidente na Bandeirantes, no dia  10/10/10(!)).
"Quero um país de classe média"!!!!!!! aí mora o perigo. Fazer a equivalência entre a erradicação da pobreza e a criação de um país de classe média é um movimento pra lá de sinistro. Pois hoje deveríamos ser capazes refletir verdadeiramente sobre o que é viver bem, para além dos ideais limitados e produtores de lixo da classe média brasileira. Será que esses que hora ocupam o governo já não são suficientemente imaginativos para oferecer para aqueles que acabaram de se tornar interlocutores no debate político algo mais do que os confortos mornos e infelizes de nossa classe média???? Devemos ser capazes de encontrar outras opções de vida particulares, adequadas para cada região. Deus livre o Brasil de se tornar um grande sudeste.
Pra continuar pensando sobre o assunto:

2-http://tapecuim.blogspot.com/2008/01/diversidade-socioambiental-eduardo.html

"Brasil tem mais de 70 grupos indígenas isolados, aponta Funai"

"Tribos vivem sem contato com o 'homem branco'.
Órgão trabalha para demarcar reservas sem contatá-los.

Lucas Frasão Do Globo Amazônia, em São Paulo

O Brasil tem 76 grupos indígenas vivendo em situação de isolamento ou contatados pela primeira vez recentemente. Ao menos 28 tribos isoladas já foram confirmadas pela Fundação Nacional do Índio (Funai), mas o órgão ainda estuda mais de 40 pontos em que há possibilidade de encontrar povos isolados.

A informação é do historiador Elias Bigio, responsável pela Coordenação Geral de Índios Isolados e de Recente Contato da Funai, que apresentou nesta quarta-feira (27), em São Paulo, a versão mais atualizada do mapa que indica a localização dos isolados.

Todos os grupos isolados estudados pela Funai ficam em estados da Amazônia Legal, exceto o povo Avá-canoeiro, cujo isolamento em uma área de Goiás, ao norte de Brasília (DF), ainda é investigado.

Segundo Bigio, 6 povos foram contatados pela primeira vez recentemente. É o caso dos Piripikura, em Mato Grosso, dos Akunt'su e dos Kanoê, em Rondônia, dos Korubo e dos Suruwaha, no Amazonas, e dos Zoé, no Pará.

Foto: Reprodução

Com exceção de um povo isolado que vive em Goiás, todos os outros indígenas não contatados estão em estados da Amazônia Legal, informa a Funai. (Foto: Reprodução)

Apesar da confirmação desses povos, desde a década de 1980 a política da Funai é de não fazer mais contato com tribos isoladas, ao contrário do que ocorreu em toda a história brasileira. "Há povos que não querem contato ou só querem poucos recursos. Hoje o trabalho é de identificação, sendo que é possível demarcar uma terra indígena sem contatar as tribos", diz Bigio.

Memórias sertanistas

Elias Bigio veio a São Paulo para prestigiar um encontro tido como histórico por organizadores e participantes. Trata-se da reunião, na capital paulista, de sertanistas que vivem há anos em diversas áreas da Amazônia e se aventuram em expedições que duram dias no meio da selva, trabalhando na linha de frente para tentar compreender a geografia e a cultura dos índios isolados.

O encontro Memórias Sertanistas celebra 100 anos de indigenismo no Brasil, cujo marco inaugural foi a criação do Serviço de Proteção do Índio e Localização de Trabalhadores Nacionais (SPI), em 1910. A instituição foi extina em 1967, com a criação da Funai.

Para relembrar algumas histórias de contatos com indígenas, o evento reúne sertanistas como Afonso Alves da Silva e José Carlos Meirelles, que já chegaram a ser atacados com arco e flecha, e antropólogos como Betty Mindlin, Carmem Junqueira e Mércio Gomes, ex-presidente da Funai. A programação gratuita segue até o fim desta quinta-feira (28) no Sesc Consolação."

(no link: http://www.globoamazonia.com/Amazonia/0,,MUL1626736-16052,00-BRASIL+TEM+MAIS+DE+GRUPOS+INDIGENAS+ISOLADOS+APONTA+FUNAI.html)